quinta-feira, 24 de setembro de 2020

Sobre o livro A Medicina Pós-Hipocrática: O problema e a solução. Autor: Hugh J. Flemming

    O livro A Medicina Pós-Hipocrática: O problema e a solução, foi publicado no Brasil em 2017. A obra foi escrita por Hugh J. Flemming. Em apenas 60 páginas, o autor consegue surpreender os leitores com a sua capacidade de unir história, bioética, moral e teologia de uma forma fácil de ser compreendida até para leitores iniciantes nos estudos das humanidades.

    O foco principal da obra é desconstruir a narrativa que os valores judaico-cristãos foram e são maléficos para a prática médica e apresentar ao leitor como a ética cristã influenciou os cuidados médicos e como a civilização ocidental se beneficiou dessa prática. 

    A obra é distribuída em 04 partes principais
            1) O período bíblico
            2) O período da igreja primitiva
            3) A idade média 
            4) A idade moderna.

    A primeira parte (O período bíblico) é dividida por Hugh em dois tópicos: O Antigo Testamento (AT) e O Novo Testamento (NT). O autor narra que duas verdades foram reveladas no AT: a Santidade de Deus e a criação do homem à Sua imagem e semelhança (imago Dei). Essas verdades, para ele, são os princípios fundamentais dos valores judaico-cristãos. Além disso, há várias passagens do AT que narram Deus curando o seu povo. Já sobre o NT, o Autor apresenta o Deus médico dos médicos, que cura os doentes, ressuscita mortos e alerta a todos que querem segui-lo que terão obrigação de cuidar de órfãos e viúvas, bem como deixa bem claro a todos os seus apóstolos que terão o dom da cura ao usarem Seu nome. 
    Acerca da segunda parte (A Igreja Primitiva), o autor aborda profundamente os primeiros passos da religião cristã, principalmente no que diz respeito à prática médica, e as resistências que enfrentou nas civilizações de cultura greco-romanas, onde o deus Asclépio (Esculápio para os Romanos) era considerado o grande "curador". 
    A principal diferença indicada por Hugh é que o tipo de philantropia (filantropia) praticada pelos médicos greco-romanos, "seguidores de Asclépio", não podia ser definida como amor à humanidade, mas sim ser polido, gentil e simpático. Não que estas características sejam inúteis ou ruins, muito pelo contrário. Contudo, os profissionais greco-romanos demonstravam pouco interesse pelos pobres e necessitados, preferindo tratar os ricos e poderosos que podiam lhe oferecer bens e sacrifícios ao deus Asclépio. Assim, podemos definir esse tipo de prática como utilitarista, estadista e impessoal
    Já a prática médica judaico-cristã, segundo o autor, é baseada no agape (amor cristão), que busca o bem e a cura em todos os enfermos, até mesmo seus inimigos, ainda que contaminados com patógenos mortais em epidemias.
    Em meados do século III uma praga devastou o Império Romano, e os cristãos responderam, apesar de terem sido perseguidos pouco tempo antes de forma intensa e cruel, com um heroísmo desconhecido no mundo antigo. Durante essa praga, surgiu um grupo de cristãos conhecido como parabolani ("os imprudentes"), os quais não mediam esforços para cuidar de TODOS os infectados. Essa preocupação dos cristãos para com os doentes e até mesmo para com seus perseguidores, deu origem aos primeiros hospitais. O  Hospital de Basileia foi fundado por cristãos na Capadócia no ano 372d.c, se tornando o mais conhecido. 

"O médico humano, portanto, manifesta o espírito do agape, da compaixão semelhante à de Cristo, no cuidado para com os doentes, em especial os pobres desprovidos, sem nenhuma intenção de recompensa ou medo de contágio."                                                                                                                                                         - Hugh J. Flemming

   O terceiro período abordado pelo autor (A Idade Média), trata sobre o desenvolvimento da cosmovisão judaico-cristã na sociedade e refuta a narrativa de denominar esse período como a "idade das trevas". Além disso, fala como a arte médica com valores hipocrático-cristãos foi difundida na Europa Ocidental e Oriental, sendo imprescindíveis para garantir tratamento e cura aos seres humanos, sejam pobres ou ricos, infectados com doenças mortais ou não.
    No último período abordado (A Era Moderna), o autor fala acerca da queda das restrições criadas pelo clero e o avanço dos estudos na área de anatomia, cirurgia, imunologia, etc. Hugh ainda escreve acerca de sua preocupação com os caminhos que a medicina está tomando e com as consequências caso ela abandone seu lado artístico e virtuoso para tornar-se utilitarista e tecnicista.    
    Por fim, podemos concluir que a mensagem passada pelo livro é de que a medicina não seria o que é sem os valores hipocráticos e cristãos, e que devemos preservar os princípios e virtudes que norteiam a arte.  

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